Erlangen, Alemanha.
A manhã se desnuda fria e ensolarada, como muitas já vividas aqui. Diferente mesmo é o imponente prédio da Universidade de Erlangen, incontáveis vezes ladeado, mas pela primeira vez invadido. O riso me vem a face, assumindo o lapso de quem se descobre desconhecedor das cercanias de onde viveu por mais de dois anos e visita com frequência há dez.
Encontro o velho amigo Miguel, camarada das mal rabiscadas linhas daqui, e um grupo de escritores heterogêneo e internacional, embora composto em grande maioria por brasileiros.
Encontro também outros parceiros de risadas, ali a convite do Miguel e da Jamile, que descobri artífice do evento em terras alemãs.
O tema do encontro são escritoras brasileiras diaspóricas e a maior frequência de sua produção quando em outro país. E melhor que discutir estatísticas e hipóteses sobre a profícua produção feminina no exterior, é reviver a academia, essa querida de outrora…
“Portas mais fechadas, livros mais abertos”(*), resume e sintetiza muitas das agruras que um expatriado vive. A necessidade de se expressar, de se fazer ouvir, de se reconhecer como humano, brasileiro, indivíduo. Dotado ainda de sabedoria e poder criativo, mesmo sem as etiquetas que ostentava no Brasil: o filho de fulano, o estudante, o professor da UXY, o profissional bem sucedido. Inverno e distância trazem sim reflexão. E a literatura, o criar, também foram meus remédios para enfrentar os desafios impostos pela nova etapa.
Os versos colhidos das folhas de árvores seminuas, e sua declamação majestosa, pelo autor Natan Barreto, deleitam a plateia, extasiando e empolgando inclusive a este prosador, nunca poeta nem literário, mas que escreve também sem esperar por aplauso.
A reflexão impressionante sobre o texto e sobre o processo criativo de poetas, mal permite que o ar entre nos pulmões dos ouvintes, pela concentração exigida no parco tempo da apresentação.
O intervalo é de Bob Dylan e seu Nobel, de estilos, de comparações entre produção criativa e acadêmica, de inserções de diálogos lançados por estranhos em poesias…
Autores citados, livros, lugares e processos criativos a conhecer.
O que sei é que nada sei. Pequeno entre gigantes, mas orgulhoso da nacionalidade desses e de dividir a experiência por poucas horas.
Bom saber que aquela necessidade que as vezes me assalta, de precisar “soltar as palavras”, independente de haver público e do alcance delas, já passou por aqui. Como a parábola citada da transmissão de uma ilha e dos rádios desligados…
Miguel e sua Sofia, brinda a busca da mesma. Passando por Adam Smith, Roger Scruton, Marion Zimmer Bradley. Sem Brecht, sem Haroldo de Campos, sem perder o propósito do que quer compartilhar.
Sinto pena de não ter visto a pena de Jamile. De não ter desfrutado os títulos que me chamam a atenção no programa.
Por quase quatro dias, Natan amou Else que amou Jamile, que amou Roberto, que amou Roseni.
E foram tantas as estórias de um livro ainda aberto, que definiram um novo encontro no Líbano, que ainda não havia entrado na história.
por Celsão ele mesmo
P.S.: o “encontro” do título foi o IV Encontro Mundial de Escritores Brasileiros no Exterior, evento do qual tive o prazer de participar no último dia. A foto da figura do post foi tirada no encerramento.
(*) frase “emprestada” de Simone Malaguti, que participou do encontro
Gostei muito das reflexões do Miguel no Encontro. Fico a aguardar futuras palestras para que possamos dar continuidade ao(s) tema(s). Parabéns!
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Excelente texto. Parabéns.
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Deveras!! Um encontro inesquecível entre pessoas tão diferentes nos seus percursos individuais, mas aliadas em torno de um propósito em comum: Erlangen!! Lá onde a Friedrich-Alexander Universität acolheu com tanto apoio e respeito o trabalho desenvolvido por essas brasileiras e brasileiros tão longe da terra natal, embora unidos pela literatura e pela língua, a qual carregam consigo como sua casa itinerante, numa celebração coletiva a cada encontro marcado em distintos lugares. Sinto-me honrada em participar desse grupo-família que, desde 2014 (no meu caso), vem estreitando as relações e anunciando a beleza de amizades que eu, pessoalmente, jamais havia vislumbrado ser possível!! Brasileiras e brasileiros admiráveis na sua luta pessoal, na sua força desafiadora e na sua capacidade de contribuir para um mundo, se não mais justo, pelo menos mais humano e solidário. Vocês foram (têm sido, melhor dizendo) um exemplo e uma motivação para eu prosseguir na minha jornada acadêmica, às vezes tão árida e distante na sua pretensa cientificidade!! O legado que vocês deixam supera as fronteiras em que cada um/a de vocês hoje se encontra, tecendo vínculos em tantos pontos do planeta que, mais do que o cérebro, enlaçam corações. Uma rede crescente de escritoras e escritores do Brasil que podem e fazem a diferença neste mundo que costuma ser tão árduo, inclusive com vocês mesmos! Saudade desses momentos tão ricos, de dias tão esplêndidos!!!
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Celsão,
Seu texto é lindo! Que talento!
Você deveria estar no Encontro Mundial como escritor. Qual é seu e-mail?É muito gratificante
ler seus comentários sobre o evento que a Jamile e eu tivemos o prazer de organizar
Abraços,
Else
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Excelente seu comentário Rose, assino embaixo.rs
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Celsâo.Também gostei muito do seu texto. Else tem razão, já vai se preparando para o Lí
bano. rs
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