Pois é.
Não bastasse falecimento de João Ubaldo Ribeiro e Rubem Alves há cerca de uma semana, o pernambucano Ariano Suassuna também abrilhantará os céus com sua refinada literatura.
Do primeiro tenho a lembrança de crônicas engraçadas e ásperas, crítica social num sorriso mágico. Comparo-o com o Vinícius de Morais e ao Gilberto Freyre… A primeira comparação (talvez injusta) de um boêmio e frequentador de bares e a segunda, provável confusão de minha parte, entre obras famosas de ambos; mesmo sabendo que “Casa-Grande & Senzala” nada tenha a ver com “O Povo Brasileiro”.
Li numa reportagem da internet, que Ubaldo era poliglota e dentre as línguas estava o alemão. Surpresas a parte, vale ressaltar a simplicidade do baiano, que não usava estrangeirismos, nem ostentava essa condição.
De Rubem Alves vem de cara “A Maçã” e a descrição polvilhada de detalhes envolvendo os cinco sentidos; afinal, como ele dizia “O paraíso mora dentro dos olhos”. Tenho um primo que o admirava e conversamos, coincidentemente, no mesmo dia de sua morte, sobre seu frágil estado de saúde.
Dele me vêm Mario Lago à cabeça, talvez pela relação de haver conhecido ambos na velhice, com cara de bonzinhos… e outro Rubem que admiro, o Fonseca; certamente nascida da confusão dos autores e de crônicas lidas e relidas muitas vezes.
Rubem conseguiu escrever sobre religião de um modo coerente e livre de tabus e dogmas. Explorava num texto, falando de pipoca, do catolicismo ao candomblé, correlacionando à filosofia e antropologia; falou também sobre vida e morte, mas certamente não agrada aos evangélicos mais radicais, por ter sido ex-pastor e assinado textos contundentes. Mas ao mesmo tempo, Rubem escreveu premiadas estórias infantis e batalhou duro para melhorar a educação brasileira e o modo como vemos a escola. E essa contribuição é inegável.
E com o Suassuna, meu preferido nessa tríade, me vem toda a riqueza do Nordeste, o rústico e belo, a carga cultural perfeitamente explorada sem ser modificada, os neo-neologismos, Guimarães Rosa, o poder criativo em peças e estórias originalíssimas e brasileiríssimas.
Me vem rabeca, cordel recitado com sotaque “nortista”, praia, música de Mestre Ambrósio. Mas nenhum outro autor ou personagem me vem à cabeça, só ele mesmo, artista singular. Sua fala mansa de nordestino, mas firme e densa em conteúdo, como nenhum outro. Sua análise política, militância nacionalista (e nordestina) e pensamento fora do padrão são inspiradores pra mim. Difícil resumir aqui o “todo” que via nele e em sua genial obra.
Acompanhei entrevistas e declarações prevendo e temendo esse fim. Temia em perder todas aquelas ideias críticas e ao mesmo tempo fantasticamente criativas…
A literatura e o Brasil perdem eruditos, pessoas capazes de criticar com propriedade e conhecimento; detentoras do dom da língua e atentas aos desdobramentos desta.
Infelizmente, mesmo sendo dois deles imortais na Academia Brasileira de Letras, não menos mortais que os demais foram em vida…
por Celsão correto
Figura: montagem de imagens do google
P.S.: Para quem quiser ler algo destes autores, recomendo a página www.releituras.com, mas separei aqui os menus de João Ubaldo Ribeiro (aqui), Rubem Alves (aqui) e Ariano Suassuna, o menos completo deles (aqui).
P.S.2: recomendo também a carta que o Matheus Nachtergaele escreveu ao Ariano Suassuna (aqui)