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Há poucas semanas tive o privilégio de assistir a um show antológico: Caetano Veloso e Gilberto Gil, juntos, dividindo o palco. Isso aconteceu durante a turnê destes na Europa. Fui até Bruxelas para vê-los.

Bom, o que dizer desses dois ícones da música brasileira? Por mais que eu elogie, não passará de pura redundância. São maravilhosos! Suas vozes, um pouco desgastadas após longos 73 anos (ambos), porém com excesso de experiência, maturidade e doçura.
Caetano suave e elegante, Gil maroto e marcante, nada de incomum, muito de fascinante.
Ahhh, e como toca violão o Gil! Quanta ginga, quanta técnica, quanto domínio. Dá aquela “inveja boa” a qualquer mineiro que tem o violão como Hobby. Ali, na sexta fileira, a 10 metros deles, eu já estava no meu terceiro babador.

Levantaram-se, despediram-se, muitos aplausos. Gritos de “mais um”! Eles voltaram, tocaram mais quatro canções. Levantaram-se, despediram-se, aplausos e gritos de “mais um”. Era um pedacinho do Brasil em Bruxelas. O público não ia embora, e continuava gritando “mais um”.

E eles voltaram. Dava para ler os lábios de Caetano, ainda caminhando em direção ao seu banquinho, reclamando com o Gil e dizendo: “vamos tocar o quê? Não ensaiamos mais nada!” E então li Gil dizendo: “toque qualquer coisa sua e pronto!”… Caetano emburrado, Gil rindo à beça. Tocaram cada um mais uma, e aí sim, fim.

Bom, essa foi a parte bonita do show. Mas também teve uma parte feia, para meu desgosto, mas não para minha surpresa: o público.
Ao chegar ao local do evento, percebi um público bem mesclado, mais ou menos metade brasileiro e metade belga ou europeu. Cheguei com 30 minutos de antecedência. O show estava marcado para as 20:00. Às 19:45 sentei-me em meu lugar e esperei.

Já eram 19:55 e notei que muitos lugares estavam vazios. Às 20:00 a maioria dos lugares já estavam preenchidos, mas uns 15% ainda estavam vazios, e muitos deles nas fileiras de frente.

O show atrasou, e assim alguns ainda conseguiram chegar a tempo. Alguns espertões começaram a vir de trás e pegar os lugares mais à frente, que na cabeça deles estariam desocupados. Pensei com meus botões: pronto, isso não vai prestar…..
Quando Caetano e Gil apareceram no palco às 20:35 ainda haviam muitos lugares vazios, o que já começou a me incomodar, pois eu sabia que aquelas pessoas, principalmente as das primeiras fileiras (as mais caras), já já chegariam.

Bingo! Foi o show começar, as luzes se apagarem, e os atrasadinhos começaram a chegar. Uns às 20:45, outros às 21:00, normalmente em grupos maiores que 4 pessoas, o que sempre gerava um alvoroço, pois os seguranças tinham que acompanhá-los até seus lugares, com lanternas que quebravam o clima do show. Chegando aos lugares, precisavam convencer os espertalhões que pularam para a frente a voltarem para seus lugares, para então poderem acomodar os atrasadinhos. Cada grupo que chegava, eram 3 a 8 minutos de barulho, luz de lanterna, e cabeças na frente. Notava-se que o idioma entre eles era, em sua maioria, o português.

Os campeões chegaram às 21:35, 1 hora e 35 minutos após o horário marcado para começar o show!!! Fala a verdade, tem que ser muito cara de pau, não?

Em paralelo, a cada 5 minutos passava alguém agachado, ia lá para debaixo do palco com o pretexto de tirar aquela foto especial, e aí, “como já estava ali mesmo”, sentava-se no chão, pertinho do palco. Aí vinha o segurança com a lanterna, e pedia para a pessoa voltar ao seu lugar. E assim foi durante todo show, até que os seguranças perderam o controle.

Quando Caetano e Gil despediram-se pela primeira vez, o público levantou-se para aplaudi-los. Ali na frente havia dezenas de pessoas agora, em pé, tirando suas fotos e fazendo seus filmes, e tampando a vista de todos os que estavam sentados em suas cadeiras. Os dois voltaram, e essa galera não mais se sentou ao chão, ficaram de pé, na frente do palco, enquanto todas as outras cerca de duas mil pessoas estavam sentadinhas em seus lugares. Então começaram os gritos de “senta aí”, “abaixa”, “senta por favor, não estou vendo nada”…

Caetano_Gil_Civilidade
A senhora ao meu lado, de uns 70 anos, sozinha, belga, estava apavorada com aquele comportamento. Obesa, levantou-se e pediu com toda sutileza que se sentassem. Foi ignorada.
Então foi minha vez, não tão sutil assim, somente mantendo a voz baixa para não atrapalhar o espetáculo. Com muito custo eles se sentaram. E assim, aqueles que pagaram pelo direito de estar mais perto dos artistas puderam assistir as últimas 2 canções sem maiores aborrecimentos.

Isso se chama “civilidade”, ou a falta dela. Mas eu, como incansável sonhador, acredito que nossa sociedade brasileira chegará lá, num futuro próximo.

por Miguelito nervoltado

figura retirada daqui

Charlie_HebdoQuando cursava a 6ª série do Ensino Fundamental, lembro-me das aulas de Ensino Religioso com o Professor, agora amigo, Evandro Albuquerque. Apesar de estarmos em um Colégio Católico, Evandro ensinava “as religiões”, e não o catolicismo ou cristianismo. Nós, alunos católicos, ríamos dos hinduístas por adorarem um Deus com cabeça de elefante, ou dos budistas por darem três voltas em volta do templo, ou dos judeus com a circuncisão quando criança, ou dos médiuns umbandistas que tomam cachaça e fumam charuto quando “incorporam” e depois dizem que quem bebeu e fumou foi a Entidade e não eles próprios, ou dos muçulmanos que acreditam que, ao morrer, terão no céu um palácio de grandeza diretamente proporcional ao tamanho de sua fidelidade em vida aos ensinamentos do Corão.

Então, Evandro olhava-nos com seriedade e severidade e dizia: “as outras religiões também riem de nós por enfiarmos a cabeça numa bacia de água, supostamente ‘benta’, recebermos um sinal de cruz feito pela mão de um padre em nossa testa, e então acreditarmos que agora fomos introduzidos no ‘Reino de Deus’. Portanto, respeitemos, em integridade, as culturas e crenças do próximo“.

Vivendo fora do Brasil, já tive contato com diversas pessoas crentes no islamismo, e lhes digo uma coisa sem titubear: eles têm cabeça, dois olhos, pelos, cabelo, duas pernas, dois braços, falam, caminham, brigam, sorriem… alguns são antipáticos, outros um doce. Engraçado não? Eles parecem com a gente!

Pois é, muçulmanos não são monstros, mas sim pessoas normais, como todos nós, com crenças particulares, assim como nós.

Com um muçulmano específico tive até a oportunidade de me tornar grande amigo. Um Paquistanês que trabalha na minha firma. Ele está entre as cinco pessoas mais dóceis que já conheci nesse mundão. Simples, competente, amável, prestativo, conquistou até mesmo o carinho dos alemães mais frios do meu departamento. Conversamos muito sobre a vida… uma delícia filosofar com ele, tamanha pureza e nobreza de coração, e clareza de pensamento. Defende o amor como caminho para acabar com a pobreza, as desigualdades do mundo, as injustiças… um sonhador.

Também conversamos muito sobre religião e aprendi com ele um pouco sobre o islamismo no qual ele acredita, e não me pareceu mais radical que algumas igrejas neopentecostais atuantes no Brasil.

Com sua barba até o peito, em homenagem a Maomé, Ahmad certo dia me olhou e disse: “Miguel, terroristas são uma pequena minoria, que nos envergonham no mundo, criando falsos estereótipos sobre nossa religião. Nem mesmo as explorações que sofremos, o imperialismo do ocidente sobre nossos países, a nossa falta de liberdade política, cultural e econômica, as guerras nas quais vivemos devido a interesses estrangeiros; nada disso justifica atos bárbaros, assassinatos, principalmente de inocentes“.

Há poucos dias o mundo novamente entrou em estado de choque com o atentado no jornal Charlie na França. Acompanhando um pouco a imprensa brasileira, notei o foco na barbárie do ato, mas praticamente a ausência do debate da perspectiva cultural e religiosa da ofensa sofrida pelos muçulmanos.

Ora, claro que nada justifica o assassinato daqueles profissionais da imprensa, e eu jamais iria me posicionar a favor desses fanáticos religiosos. Porém penso que o humor, como tudo na vida, tem limites, e agredir e desrespeitar os mais profundos valores de alguém, atinge esses limites. Nossa liberdade termina onde a do outro começa. (Clique AQUI para ler nosso artigo sobre os limites do humor, que acompanha um excelente documentário)

As religiões são as maiores causadoras de guerras no mundo. O fanatismo religioso então, é ainda mais grave.

O ideal seria não existirem extremismos e fundamentalismos religiosos, mas, infelizmente, existem. Assim sendo, custa respeitar certas fronteiras? Custa respeitarmos a cultura e crença do próximo enquanto elas não invadem nossas crenças e culturas?

Em nossa cultura, nós cometemos atos impensados quando agridem nossos pais ou filhos. Na deles, quando agridem seu Deus. O que é mais grave?

Pensemos também no comportamento da imprensa mundial, e como nós, enquanto sociedades, usamos nossa consciência ao consumir uma notícia: o assassinato dos funcionários de um jornal quase desconhecido causa comoção mundial. Cidadãos comuns ficam escandalizados e mostram sua indignação. Líderes de Governos fazem passeatas e discursos eloquentes;
Porém, quando um míssil fornecido pelo governo e indústria americana a Israel, é lançado por este país em cima de uma escola Palestina, matando dezenas de crianças que ali estavam estudando, isso fica no noticiário no máximo durante dois dias, os cidadãos se indignam e já se esquecem no dia seguinte, e nenhum líder faz passeata.
Seria um tipo de hipocrisia, ou no mínimo, uma sensibilidade seletiva?

Eu sou contra o fanatismo religioso, assim como sou contra o imperialismo, as retaliações, a escravização que o ocidente, principalmente os EUA, praticam sobre os países muçulmanos.

O jornal Charlie Hebdo já havia sofrido avisos e ameaças anteriores. Os jornalistas não mereciam a morte, mas poderiam tê-la evitado.

por Miguelito Formador

Indico o excelente artigo de Mino Carta, que entre tantas críticas inteligentíssimas, foca na hipocrisia e na seletividade da indignação mundial, dentro de um jogo político e de interesses danosos à democracia e à evolução do mundo. Clique AQUI

E AQUI vai um artigo de Ricardo Melo, com uma abordagem bem diferente sobre o assunto, com foco no fanatismo religioso e nos danos que as religiões trazem para a história da humanidade.

figura daqui

Já repararam como é desesperador e fútil o comportamento dos brasileiros, principalmente Paulistas nos aeroportos?

Começando pelo celular… O avião mal toca o solo e já é possível ouvir as musiquinhas iniciais, mostrando que os aparelhos voltam a ser ligados. E, poucos instantes depois, alguns respondem emails, outros abrem o facebook, fazem ligações (!) enquanto o avião se dirige lentamente para o local de estacionamento… Sob o discurso corriqueiro e sem sentido da comissária, avisando que os cintos (há muito soltos) devem permanecer atados até que os avisos luminosos apaguem e que os aparelhos eletrônicos só podem ser usados após o desembarque.

Acho ridículo e patético o fato de uma “curtida” no facebook ou um email “enviado via Blackberry” não poderem esperar mais quinze minutos. A ligação então de: “Oi amor, acabei de pousar…” / “Eu vi no painel, benzinho, estou esperando no ponto de sempre” tampouco tem sentido!

Sem contar que tudo isso acontece com as pessoas de pé. É impressionante a velocidade com que todos levantam e fazem filas apertadas no corredor com malas, sacolas e mochilas pra terem o prazer (talvez seja essa a explicação!) de descer primeiro. Mesmo que para esperar no ônibus ou na esteira de bagagens.

Essa tal esteira também merece meu comentário.

Por que ficar colado nela, com carrinhos, crianças e badulaques? E o desespero de ver a mala “passando”? Correm desesperados como se houvesse um moedor de malas no final… Gente, a esteira é contínua. E a mala volta a passar, caso não a peguem na primeira vez.

Uma vez estava pacientemente esperando atrás dos “desesperados” (talvez gostem de reparar na mala dos outros), quando percebi minha mala na esteira. O movimento na minha frente não diminuia, mas não havia pressa e esperei. Foi quando a moça que estava na minha frente comentou: “Essa mala vermelha já passou por aqui umas três vezes”. Respondi de bate-pronto: “Eu sei. Ela é minha”. E, depois emendei: “Mas não se preocupe que ela volta”

E depois, com os carrinhos cheios, a falta de respeito persiste. Ninguém pede “licença” nem “desculpas”, mas todos têm motivo pra passar por cima dos que estiverem obstruindo o caminho. É como se frases assim fossem ditas:

– Grávidas, cadeirantes, idosos, movam-se! Tenho pressa pois não posso perder nem um minuto do capítulo da novela.

– O quanto antes eu estiver na fila do taxi, mais tempo poderei reclamar da organização do aeroporto, falta de atendimento preferencial aos que tem “TAM Platinum”, trânsito da cidade, etc.

por Celsão Revoltado

P.S.: o intuito aqui não foi levantar problemas técnicos eventuais advindos do uso dos celulares nas aeronaves, por exemplo, nem assustar ou propor punições. O intuito foi mostrar o quanto somos inumanos e desreipeitosos para com o próximo e o quanto abusamos da nossa liberdade individual sem pensar no coletivo.