Falta-me inspiração. O objetivo era escrever algo relacionado ao Natal e Ano Novo.
Fiquei refletindo na cama ao deitar nos últimos dois dias: será que escrevo um conto, ou poema, ou uma crônica, ou dissertação? Será que escrevo algo crítico, como de costume, ou algo mais leve, para combinar com os anseios das pessoas nessa época? As ideias críticas que me vieram, pareciam muito clichês, os mesmos ataques de sempre ao consumismo, ou o porquê do Papai Noel se vestir de vermelho, etc. As ideias brandas, porém, me pareceram igualmente clichês e bregas.
Da minha cabeça não sai uma coisa: meu trabalho.
Vésperas de tirar férias longas, demanda-se deixar tudo organizado para que a firma não tenha dificuldades sem você. Os colegas, por saberem que estará ausente, passam a lhe pedir, de uma vez só, tudo que lhe pediriam ao longo dos próximos 30 dias.
Assim, a demanda profissional mais que dobra.
Em paralelo, há os preparativos para as festas. Sim, não teve como, terei que cair no consumismo.
Sentimos obrigação de presentearmos as pessoas que amamos. Não basta um abraço afetuoso, um sorriso, um olhar sincero, nem a palavra bem escolhida. 99,9% dos seres humanos (ao menos dos que celebram Natal) esperam ganhar um ou mais presentes nesta época. Casais, pais, filhos, bons amigos, amigos ocultos, afilhados, etc, sempre esperam algo, e se não ganham, ficam frustrados.
Então, depois de sair do serviço já as 19h, o roteiro de vários dias do mês de dezembro é: shopping, lojas, ou então, ir para casa para pesquisar preços na internet.
No meu caso, tenho o adendo de minha viagem ao Brasil que se aproxima, o que também exige muitos preparativos. Além de minhas próprias tarefas, também começam a surgir as encomendas: pode trazer isso para mim, aquilo, é baratinho, é pequeno, é fácil de achar… e nessas dezenas de coisinhas pequenas e fáceis de achar, lá se vão horas e horas dos meus dias, e minha única mala de 23kg (limite da companhia aérea) vai ficando cheia, de coisas para os outros, e faltando espaço para minha calça jeans.
Então, neste contexto, escrevendo aqui só para ver o que saía, me veio a brilhante reflexão: será que é só a mim que falta inspiração, ou será que a muitos, talvez, a maioria? Será que nossas expectativas e preparações para estas celebrações, acabam nos causando tanto estresse e desgaste, que talvez seria melhor nem as termos?
Pensando por esse lado do estresse, parece que minha afirmação é razoável.
Mas, inegavelmente, Natal e Ano Novo, apesar dos pesares, são datas que, quando chegam, enchem nossas casas de alegria. É a hora de estarmos com a família e pessoas amadas.
No Natal, muitas pessoas por todo o planeta se reúnem em mutirões para arrecadarem presentes, vestuários, comida, para em seguida, doá-los àqueles que menos possuem. Nas orações, ou envios de bons pensamentos, pessoas se lembram de desejarem aos desafortunados mais sorte, mais alegrias.
No Ano Novo, é hora de darmos três pulinhos e fazermos trocentas promessas, todas elas positivas. Mesmo que não as cumpramos, pelo menos, lembramos daquilo onde temos que melhorar.
Ideal seria termos os sentimentos do Natal com as metas do Ano Novo, durante os 365 dias do ano, e preferencialmente, sem o estresse que os antecede… hahaha
Mas isso é uma utopia, diria alguém, como se a utopia fosse algo ingênuo, bobo, ruim.
Eu então lembraria Eduardo Galeano, que nos diz didaticamente que: a utopia é como o horizonte, se damos dez passos em sua direção, ela se afasta dez passos. Sempre estaremos infinitamente distante dela. Então, para que serve a utopia? Ora, para que possamos caminhar, em frente.
A minha utopia de fim de ano, então, é simples: que cada vez mais, os presentes materiais sejam menos importantes, e que os abraços, olhares e palavras, sejam mais valorizados. Que cada vez mais, precisemos orar menos pelo próximo, o que significaria que a maioria das pessoas têm uma vida boa. Que cada vez mais, mais pessoas entendam que a caridade só é necessária, pois o mundo é repleto de injustiças e desigualdades, e que boa parte destas são causadas pelas nossas formas de pensar, de agir, e de fazer política, e que portanto, nós que praticamos caridade, somos muitas vezes, os próprios causadores da necessidade da caridade.
Que cada vez mais, o ser humano respeite o próximo em sua plenitude de Ser, com suas diferenças, um respeito íntegro e completo, sem hipocrisias, entendendo e aceitando que todos, independentemente da cultura, religião, cor de pele, crenças, gênero, estatura, peso, preferência sexual, nacionalidade, devem ter os mesmos direitos civis, e serem respeitados em sua plenitude. Que cada dia mais, mais pessoas entendam que a liberdade é uma benção, mas que ela tem limite, e que nossa liberdade acaba onde começa a do outro. Que cada dia mais, as pessoas entendam que sim, elas têm o direito de emitir opiniões, mas que suas opiniões geram impactos ao seu redor, causando sofrimento, e que portanto, é preciso termos noção, não só de nossos direitos, mas também de nossas responsabilidades e deveres.
Feliz Natal, com muito amor e paz. E um Ano Novo de mais sabedoria, mais empatia, mais respeito, mais interesse, mais leveza, e principalmente, mais amor a todos. Esses são meu votos. Ou seriam, minhas utopias? 🙂
por Miguelito Formador
figura retirada daqui