Vivemos a história todos os dias.
E na Argentina, que elegeu recentemente o direitista Mauricio Macri, podemos e poderemos observá-la bem de perto.
Nos primeiros meses de governo, Macri demitiu 12 mil empregados públicos e colocou em revisão outros 60 mil contratos.
Há acusações de perseguição política por parte dos demitidos e de “Kirchnerismo” por parte da vice-presidente Gabriela Michetti.
O fato é que, mesmo que todos os despedidos sejam militantes de esquerda, demissões em massa certamente não ajudarão o político a ser popular entre os mais carentes; e tampouco auxiliarão na importante soma dos “prometidos” um milhão e meio de novos postos de trabalho. Destacando ainda que, além dos novos postos de trabalho, o empresário-direitista prometeu também “pobreza zero” em campanha.
Além das demissões e revisões contestadas, Macri revogou a lei de médios aprovada por maioria do congresso argentino em 2009. Essa lei visa limitar o controle da mídia por grandes corporações e oligopólios familiares nesse ramo.
Ou seja, o movimento neo-liberal argentino tem a princípio mais cara de ditadura que a esquerda peronista.
Pensando num mundo ideal e perfeito, o presidente Macri pode ter sucesso. Desinchar a máquina pública, movimentando os trabalhadores para a iniciativa privada, dinamizará a economia trazendo dinheiro “novo”, ao mesmo tempo que deixa leve a máquina estatal.
O primeiro problema é jogar uma massa revoltada (e, muitas vezes, de oposição) nas ruas e na Argentina. Sem ter empregos garantidos, certamente essa massa descontente irá protestar.
O segundo é que retomadas econômicas são, geralmente, lentas. Mesmo que haja retomada de confiança, muito do dinheiro investido no país durante essa retomada sera especulativo. Capital que não gera emprego.
Ou seja, investimentos no país provenientes de empresas privadas, que geram emprego, resolveriam (ou acelerariam) os dois pontos. O problema é conseguir tais investimentos num curto espaço de tempo.
Tive a sorte de viajar para o país do “novo milagre latinoamericano” no final do ano passado.
Acompanhei ao menos três protestos diários, ora por educação, ora por empregos e melhores condições, ora pelas falhas no fornecimento de energia elétrica.
Falando nisso, talvez seja hora de admitir que admiro muitos aspectos dos “hermanos”. E as principais delas são o nacionalismo e a tenacidade/perseverance na luta.
Vi pichações na rua contra o presidente Macri, antes mesmo que as demissões fossem anunciadas (primeira figura do post).
E conversei, como de costume, com diversas pessoas sobre política e as mudanças esperadas. É curioso, pois nesse ponto há muita coincidência com as opiniões que vejo no Brasil atual.
– Os apoiadores de Macri repetem a frase “não dá para piorar”, como se corrupção acontecesse somente em governos de esquerda e como se o governo dele não fosse formado por pessoas.
– Os peronistas (simplificando a classificação), assumem que as medidas do governo não trouxeram o desenvolvimento e que houve piora industrial, com consequente “achatamento” da classe média. A “magia social” aproximou pobres da classe média, mas não deu chance para a classe média enriquecer. Alguns desafiam Macri com: “vamos ver o que ele consegue fazer!”
Algo próximo do que acontece por aqui, pois muitos dos que votaram e acreditaram no PT “abraçaram” o discurso da oposição e não mais acreditam numa retomada da economia.
Retomando às ações intepestivas do Macri, ele também decidiu interromper os subsídios governamentais presentes nas contas de energia elétrica e gás. As contas aumentaram em até 300% para o gás (aqui) e 700% para a energia elétrica (aqui).
Quem será que mais sofrerá com esses aumentos? O dono da mansão ou o funcionário público recém-demitido?
O perigo de prejudicar a camada mais baixa da população no afã de re-industrializar o país é altíssimo e está sendo ignorado. E arrisco a dizer que propositalmente.
O problema dele é que o povo seguirá nas ruas, promovendo protestos e pressionando o governo.
O que você acha que acontecerá com o governo Macri?
Reerguerá a Argentina levando-a de volta ao protagonismo regional e mundial ou sucumbirá à pressão popular, trazendo de volta ao poder o federalismo de esquerda?
Qualquer que seja o resultado, será interessante também observar os indicadores sociais e as mudanças na mídia em nosso país vizinho.
Quiçá tenhamos tempo de refletir e evitemos Trumps e Bolsonaros por aqui!
por Celsão irônico
figuras retiradas daqui, daqui e de arquivo pessoal
P.S.: para quem quiser ver um vídeo-resumo interessante sobre o começo do governo Macri (em espanhol), clique aqui.