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post_nuzmanNosso ilustríssimo presidente do COB (Comitê Olímpico Brasileiro) acaba de se reeleger pela sexta vez. E completará ao final do seu mandato, 25 anos no poder.
Mesmo sabendo desde já que esse é seu último mandato, pela idade que terá em 2021, essa perpetuação é algo absurdo e inaceitável.
A lei permite que ele faça isso. Leis semelhantes amparam outros presidentes de entidades desportivas (CBF, CDBA, CBTKD, entre outras) a se manterem nos cargos por décadas.
Mas não são as leis, nesse caso, que estão erradas ou distorcidas (ok! talvez um pouco); o que envergonha é a manipulação das federações, visando esse regime ditatorial e pernicioso.

Não há como negar que a alternância no poder, especialmente nesse caso, seja benéfica.
Se por um lado há o risco do sucessor desfazer as melhorias e processos do sucedido, essas medidas geram o contraexemplo, a “prova dos nove” necessária para que se percebam erros e se descubram falcatruas.
Numa confederação desportiva, numa associação de classe, na gerência de um departamento de uma empresa, a perpetuação gera vícios e favorecidos, gera manipulação e segregação, gera medo!
Ninguém se opõe sabendo que perderá e, além disso, sofrerá consequências graves como isolamento.
No caso desta eleição de Carlos Nuzman para o COB, pobre da Confederação de Tênis de Mesa e de seu atual presidente, Alaor Azevedo. Certamente sofrerá consequências indesejáveis.

Talvez nem seja preciso pontuar os inúmeros escândalos no COB e em outros comitês e confederações.
Temos o caso de compra de material pela CBDA (Confederação Brasileira de Deportos Aquáticos) da empresa Natação Comércio de Artigos Esportivos, que tem como endereço registrado um pet shop em São Paulo (aqui), temos a empresa que recebeu inúmeros pedidos que fica situada a 230 metros da sede do COB na Barra de Tijuca, Rio de Janeiro (aqui), temos o caso das câmeras compradas em esquema de superfaturamento, pela Confederação Brasileira de  Taekwondo (CBTKD), também citado na reportagem…
Muitas são as confederações investigadas pelo Ministério Público e Polícia Federal; algumas inclusive tiveram recentemente seus longevos presidentes afastados por acusações de desvio de recursos (dinheiro) que deveria ser usado na preparação de atletas exatamente para as Olimpíadas e Paraolimpíadas do Rio. Notícias aqui e aqui com exemplos da Natação e Taekwondo.
E, acima dos “pilantras” menores, alguém que manobra seguidamente as regras do jogo do Comitê “maior”, daquele que defende e distribui recursos aos demais, se firma como um ditador. Tão sujo quanto todos os seus vassalos…

E não são poucos os atletas que abandonaram, temporaria- ou permanentemente, as suas federações.
Aurélio Miguel o fez após a medalha de 1988. Competindo em Atenas em 1992, mas após três anos “afastado” da confederação. Uma atleta da esgrima, Élora Ugo, medalhista mundial em 2003, o fez em protesto, por falta de patrocínio, de uma confederação acusada (também) de desvio de recursos (aqui).
O ex-tenista Fernando Meligeni, argentino de nascimento, mas brasileiro de coração, que brilhou nas Olimpíadas de Atlanta em 1996, fez sua carta de repúdio aqui.
Comum a todos estes atletas está a recusa de aceitar mandos e desmandos de pessoas incompetentes, de corruptos, de políticos infiltrados num meio que deveria buscar evolução e transparência.

Imaginemos agora aqueles atletas que tiveram de abandonar a carreira ou a preparação para os jogos por falta de recursos…
Ou aqueles inúmeros “vencedores individuais” que ou através de apoio familiar, ou se valendo de parcos recursos próprios, superaram as dificuldades da falta de dinheiro e venceram! Como seria a vida deles se não tivéssemos esse regime ditatorial e corrupto nas confederações? Quão tranquilos seriam os meses entre uma competição em outra? Com material, treinadores, alimentação e sem o stress emocional de não conseguir viver do esporte…

Aquele velhinho simpático, que tremia em suas declarações intempestivas e nas traduções despretensiosas durante as cerimônias da Olimpíada, que foi alvo de inúmeros memes e que foi defendido por depoimentos benevolentes posteriormente, esse “pobre velhinho” não merece o nosso respeito. Sequer as nossas piadas.

por Celsão correto

figura retirada daqui

Post_RafaelaTodos a querem. Agora.
Todas querem estar ao seu lado e mostrar-se parte da conquista.
A direita fala do militarismo, do esforço próprio, da não necessidade de cotas nem de patrocínio público…
A esquerda fala sobre as críticas ácidas feitas na Olimpíada anterior e sobre o estereótipo negra-mulher-suburbana tão odiado pela elite nacional.

É fato que muitas medalhas conquistadas em jogos olímpicos e pan americanos são conquistados por atletas militares. E isso desde o começo do século XX, quando as medalhas vinham exclusivamente das competições de tiro.
Independente do grau de sucateamento, a estrutura militar oferece tempo e disciplina, itens raramente exibidos em clubes nacionais e programas de financiamento ao esporte.
Então…  é (sempre) esperado que algum atleta do exército ou marinha seja laureado com o pódio e, também, por que não, com o hino.

Outro fato, inegável, mas talvez de mais complexa compreensão, é a exceção de uma medalha para atletas brasileiros.
Uma Rafaela, um Diogo Silva, um João do Pulo, um Claudinei Quirino no revezamento do atletismo são exceções.
Até mesmo atletas com melhores condições sociais, como César Cielo e Flávio Canto são exceções.
Não há estrutura para atletas profissionais. Sobretudo longe de modalidades como futebol e vôlei (esse nos últimos vinte anos). E mesmo que haja um patrocínio, aderido a ele há sempre uma ameaça de cancelamento, um atraso de pagamento, um prejuízo emocional dificilmente calculável…
E, pior ainda, se não há estrutura para o atleta de hoje, tampouco há futuro para ex-atletas profissionais!

Voltando ao cerne da questão, afirmar que Rafaela ganhou sem cotas e sem feminismo é ignorar o país onde vivemos. Que não gosta de mulher, de negros, de pobres.
E que não tolera fracassos, sobretudo de mulheres, negros e pobres.
A bolsa-atleta é um benefício que não pode ser concedido a todos. E Rafaela a possui.
É parte de um assistencialismo necessário quando a sociedade não oferece as mesmas “condições iniciais” a estudantes, profissionais e atletas. Quando não há ISONOMIA.
Sem isonomia e sem auxílio para se chegar em condições semelhantes a outros atletas no mundo, não há como mensurar deste atleta a MERITOCRACIA, palavra tão adorada pela elite que não percebe o ambiente, as cercanias em que se encontra o nosso Brasil.

O mérito existe. Não há dúvida.
É da Rafaela. É da equipe dela. É da marinha que a treinou. É do governo petista que a ajudou.

Ela venceu. Mas venceu hoje!
O resto da vida terá de aturar comentários machistas, sofrer assédios indesejados, enfrentar discriminação nos mais diversos locais, como em restaurantes, responder questionamentos obtusos sobre as favelas do Rio e a Cidade de Deus…

Coisas que o Faustão e o Luciano Huck de hoje, da festa pós-olímpica, não farão surgir novos patrocínios no amanhã.

por Celsão revoltado

figura retirada daqui

P.S.: como citei João Carlos de Oliveira, o João do Pulo, ex-recordista mundial e medalhista olímpico do salto triplo, coloco também o link da Wikipedia do ex-atleta (aqui). João foi exceção em seu tempo e virou a triste regra da falta de oportunidades na carreira de atleta: teve depressão e sofreu com alcoolismo, morrendo solitário e com problemas financeiros.