Posts Tagged ‘previdência’

Ciro-Gomes-de-anel-560x250Compartilho uma entrevista recente do provável pré-candidato à presidência (adorei o termo!) Ciro Gomes.
Na entrevista concedida ao InfoMoney, Ciro fala de inverdades difundidas pela mídia, que é cúmplice de um “pacto de estupidez”, na tentativa de proteger o atual presidente e a esperada retomada do crescimento econômico. Cito como exemplo a reforma da previdência: o ex-ministro e ex-governador nega que haja déficit e propõe mudanças numa direção distinta da atual. Critica a disparidade de valores para juízes e políticos, e a punição ridícula aplicada a juízes, da aposentadoria compulsória integral. (pontos já criticados nesse blog aqui)
Há algum tempo Ciro fala da reforma da previdência, focando no modelo de poupança própria (ou capitalização) em oposição ao regime atual de repartição (achei duas referências de 2001: aqui, onde Ciro falou em Harvard sobre o seu plano de Governo e aqui, onde usaria as reformas tributária e previdenciária para elevar o valor do salário mínimo)

Ciro critica Temer, como vem fazendo desde que o mesmo assumiu a presidência e nomeou o seu primeiro escalão.
Está pessimista em relação a 2017. Tomando uma das frases dele, dita logo antes do impeachment: “vocês estão completamente equivocados em querer colher maracujá em pé de laranja. Dessa coalizão de corruptos, incompetentes e entreguistas, não sai nada senão corrupção, incompetência e entreguismo

Ciro também cita uma das ideais “pirata” defendida aqui nesse post: redução da taxa de juros. Mesmo não sendo brusca, a redução, segundo ele, faz todo o sentido. Inclusive daria para aproveitar que as economias do mundo estão praticando taxas negativas de juros, e transformar nossa dívida interna em externa (totalmente “fora da caixa”).

Enfim… no mínimo, vale a leitura e a reflexão.
Segue abaixo, na íntegra.


InfoMoney: O senhor defende que não há rombo na Previdência. As estimativas de que o déficit do INSS vai superar os R$ 180 bilhões em 2017 estão erradas?

Ciro Gomes: Todas as vezes em que se reflete sobre um problema complexo no Brasil, os oportunistas a serviço dos interesses prevalecentes acabam reduzindo opiniões que deveriam ser complexas. A grande questão hoje é que, se você tem as receitas destinadas pela lei versus as despesas para a Previdência, não há déficit. Se somarmos CSLL, PIS, Cofins, as contribuições patronais do setor privado e público e as contribuições dos trabalhadores, contra as despesas do presente exercício, temos ainda um pequeno superávit. Qualquer pessoa que tenha um mínimo de decência e não esteja a serviço da manipulação de informações vê isso. Eles têm a audácia de falar em déficit, porque propõem uma DRU [Desvinculação de Receitas da União], que capta 30% de todas essas receitas e aloca para pagar os serviços da dívida, com a maior taxa de juros do mundo, no momento da pior depressão da história do Brasil.

Dito isso, a Previdência Social tem dois problemas. Um é estrutural, derivado de uma mudança da demografia. Tínhamos seis pessoas ocupadas para cada aposentado quando o sistema foi montado, com expectativa de vida de 60 anos. Hoje, temos 1,7 trabalhador ocupado por aposentado, para expectativa de vida superior a 73 anos. Para resolver estrategicamente a equação de poupança e formação bruta de capital do Brasil, precisamos avançar com prioridade em uma reforma, mas nunca na direção que estão propondo. E aí vem o segundo problema: o futuro ou potencial déficit da previdência brasileira se dá pelas maiores pensões, dos maiores rendimentos, que levam mais da metade das despesas. Juízes, políticos, procuradores precocemente aposentados e com pensões acima de qualquer padrão de controle do país. Isso é uma aberração. A maior punição a um juiz ladrão que vende uma sentença no Brasil é a aposentadoria compulsória com 100% de seus proventos.

IM – E o que fazer para resolver o problema?

CG – O superávit vai sumir em dois ou três anos. Temos que evoluir do regime de repartição [em que as contribuições dos trabalhadores em atividade pagam os benefícios dos aposentados] para o de capitalização [em que cada trabalhador poupa para sua aposentadoria], que é o que todos os países do mundo fazem. E fazer uma espécie de transição, que é o mais complexo mas há como fazer também, de maneira que, ao fim do processo, tenhamos uma previdência básica para 100% da população da transição, e a previdência complementar pública, porém sob controle de coletivos de trabalhadores e com regramentos de governança corporativa, com prêmios para um grupo de executivos recrutados por concurso e com coletivos de apuração dos riscos dos investimentos.

IM – Qual é sua avaliação sobre a fixação de uma idade mínima para aposentadoria?

CG – Sou a favor, desde que se compreenda as diferenças do país. Considero uma aberração estabelecer uma idade mínima igual para um trabalhador engravatado, como eu, e um professor, que, no modo como Temer vê as coisas, precisaria trabalhar ao menos 49 anos para ter aposentadoria integral. A expectativa de vida no semiárido do Nordeste, por exemplo, não chega a 62 anos. Um carvoeiro do interior do Pará também não. É preciso evoluir para um padrão que conheça o País. Há de se estabelecer uma idade mínima, mas não pode ser por um modo autoritário e elitista, ditado pelos setores privilegiados da sociedade.

IM – Há economistas que, assim como o senhor tem feito nessa discussão da reforma da Previdência, questionam os atuais termos do debate. Qual deveria ser a agenda econômica atual na sua avaliação, levando-se em consideração a força do governo e do mercado em conduzir as discussões?

CG – O setor financeiro está produzindo uma crise para si próprio, com a proporção dívida/PIB indo de 75% para 90% no ano que começou. É tão estúpido o modelo feito com [Henrique] Meirelles que agora estão produzindo o próximo ciclo de crise. É uma crise do setor bancário, cujas sementes estão dadas. Já são a maior inadimplência e o maior volume de reserva de crédito para recuperação duvidosa da história, e eles estão querendo compensar os prejuízos com a taxa de juros real, que simplesmente está fazendo despencar a receita pública. Nos estados, já é caricata a situação de Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e mais 14 estados por conta desse receituário absolutamente estúpido do ponto de vista técnico.

Temos que inverter essa ideia boba de ganhos de confiança, que vai se deteriorar todo dia muito mais. Confiança depende de números práticos, e o mais relevante deles é proporção dívida/PIB para o setor financeiro, mas para o setor produtivo é emprego, renda. Tudo isso está se deteriorando. O que tem que ser feito é o oposto do que essa gente está fazendo. Em todo momento de depressão econômica, até os mais conservadores sabem, é preciso que o governo aja de forma anticíclica para liberar uma dinâmica de retomada de desenvolvimento. E não é com farra fiscal, porque quem está produzindo desequilíbrio é a queda substantiva da receita. Basta ver que as despesas que estão aumentando são todas de iniciativa do senhor Michel Temer. A saber: reajuste das maiores corporações, a forma descuidada com que negociou a dívida dos estados e municípios.

Enquanto isso, há uma porção de iniciativas semiprontas que eles estão descontinuando. Desencomendaram 17 navios da recém-retomada indústria naval brasileira e desempregaram 50 mil pessoas; descontinuaram as obras da Transnordestina, que tinha 7 mil homens trabalhando; descontinuaram as obras do Rio São Francisco, enquanto o Nordeste brasileiro amarga seu quinto ano de seca. Tem áreas importantes colapsando o abastecimento de água humano. Essa é a realidade do governo.

IM – Qual seria a taxa de juros ideal para a retomada do crescimento, na sua avaliação como crítico à atual política monetária?

CG – Todos os grandes mercados do mundo estão com juros negativos neste momento. Qual é a razão de o Brasil ter os maiores juros reais do planeta? Teoricamente, defende-se juro alto para desconjurar inflação, que é o princípio mobilizante desses enganadores há duas ou três décadas no Brasil. Qual é a inflação de demanda que temos no país? Qual setor de produção brasileiro está com hiato de produto (demanda maior que oferta)? Estamos com a maior capacidade instalada ociosa da história moderna do Brasil.

Quando a taxa de juros foi estabelecida pela Dilma em 14,25%, a inflação estimada era de 11,5%. Portanto, se aceitássemos para argumentar — o que é uma aberração, porque a inflação que se apresentou derivou-se de preços administrados pelo governo e das consequências da desvalorização do câmbio, ambos fenômenos sobre os quais os juros não têm efeito — que 14,25% é uma taxa correta para enfrentar inflação anualizada a futuro de 11,5%, hoje a inflação projetada para 12 meses está inferior a 5%. Qual é a explicação para o atual patamar a não ser a boçalidade com que o Banco Central serve o setor financeiro?

IM – Mas seria possível reduzir essa taxa tão rapidamente?

CG – Evidentemente que está interditada a ideia, mas nada justifica que o Brasil não traga a taxa de juros tão rapidamente o quanto possível, para não quebrar expectativas e nem causar prejuízos mais graves a ninguém, e de forma profunda.

IM – O senhor mesmo tem o diagnóstico de que haveria um confronto entre as coalizões, sobretudo no mercado financeiro, no caso de uma queda abrupta na taxa. Como sair disso?

CG – Não estou falando em ser abrupto. Mas acho que o Banco Central tem que acabar com a história de reunir o Copom a 45 dias. Tem que se reunir, reduzir em um ponto [percentual a Selic] agora e anunciar um viés de baixa, que o mercado inteiro entenda. Os bancos mais sóbrios sabem que tenho razão. O Bradesco, por exemplo, sabe que a taxa de juros está causando prejuízo aos bancos. Em São Paulo, ninguém está pagando ninguém. Hoje, o Brasil está proibido de crescer também, porque o passivo das 300 maiores empresas estrangulou. No último trimestre, nenhuma das grandes empresas de capital aberto do Brasil gerou caixa para pagar o trimestre de dívida.

Os bancos privados estão todos saindo da praça e os créditos de recuperação duvidosa estão todos de novo se concentrando no Banco do Brasil e na Caixa Econômica. Enquanto isso, ninguém abre a boca. Só no calote da Oi, foram R$ 65 bilhões espetados no Banco do Brasil e na Caixa Econômica — ouça-se: nas costas do povo brasileiro.

IM – Alguns especialistas chamam atenção para a situação de endividamento das empresas e seus efeitos sobre o sistema financeiro. Existe a percepção de um processo de deslavancagem em curso, que pode culminar em transferências de controle de companhias brasileiras a grupos estrangeiros. Qual é o seu entendimento sobre esse processo?

CG – É o passivo externo líquido explodindo. O desequilíbrio das contas externas brasileiras é outro fator que nos proíbe de crescer. Então, tem-se a depressão imposta, com o governo fazendo um processo restritivo, cíclico, as empresas com passivo estrangulado e o passivo externo líquido do país explodindo, inclusive com o governo fazendo desinvestimentos na Petrobras. É um crime, e o jornalismo brasileiro é cúmplice, por regra.

IM – O senhor se diz contrário às privatizações, ao passo que existem aqueles que veem nessa iniciativa a melhor saída, tendo em vista os recentes escândalos de corrupção revelados por operações como a Lava Jato…

CG – A Odebrecht é estatal?

IM – Não.

CG – Então está aí minha resposta.

IM – O senhor é um dos poucos candidatos que se define ideologicamente de esquerda e se dedica a um debate macroeconômico…

CG – O que eu advogo é uma grande aliança de centro-esquerda, que produza um projeto explícito, fora dos adjetivos desmoralizados gravemente pelo próprio PT, que malversou o conceito ‘esquerda’ e virou uma agremiação que cooptou setores organizados da sociedade para praticar uma agenda mista de alguma atenção ao consumismo popular, mas de absoluto conservadorismo nas estratégias de desenvolvimento do país. O que advogo é a coisa prática, que dê condição de novo da sociedade brasileira voltar a produzir e trabalhar.

IM – Quais são os riscos de sua candidatura não acabar vista como representante do eleitorado progressista e tampouco conquistar alguma adesão em um debate de maior controle da direita?

CG – No Brasil, infelizmente estamos olhando de forma rasa sobre problemas complexos. Não vou mudar minha posição, continuarei tentando pedagógica e pacientemente conscientizar o brasileiro sobre essas necessidades estratégicas do país.

IM – As esquerdas no mundo estão tendo um diagnóstico errado sobre o que representa a eleição de Donald Trump (e outros fenômenos globais), ao atribuí-la exclusivamente a um discurso reacionário e xenófobo? O pré-candidato Bernie Sanders, por exemplo, teve chances consideráveis de vencer o pleito e não poderia oferecer leitura mais antagônica.

CG – Acho que esse é um olhar superficial. Evidentemente, estamos com um debate em efervescência no mundo, com o colapso da Europa, a saída do Reino Unido [da União Europeia], vis-à-vis a tensão que a China está produzindo nas novas relações mundiais. Não sei o que Trump vai afirmar, mas ele foi eleito pela negação da perversão neoliberal e do rentismo prevalecendo sobre a produção. É o trabalhador branco, desempregado, do setor industrial americano a substância da base da eleição. Bernie Sanders sistematizou um pouco mais claramente esses valores, mas de forma dialeticamente difícil de ser engolida pelo grande sistema americano.

Mas o debate está fervendo na Europa, e todo mundo percebendo que a solução para o problema é recuperar os mecanismos de coordenação estratégica do governo e por interação com a iniciativa privada. Não é estatismo ao modo velho, muito menos esse liberalismo estúpido que produziu a maior agonia do capitalismo mundial com a crise de 2008, cujos escombros estamos vivendo ainda hoje.

IM – Muitos nomes favoráveis ao impeachment de Dilma Rousseff, pensando em uma retomada da economia, começaram a se ajustar a projeções mais negativas. O país ainda pode evoluir em 2017?

CG – Não vamos evoluir. É claro que você vai assistir o Banco Central correndo um pouco mais rapidamente na direção correta, mas ainda muito mais lentamente do que o necessário, de forma insuficiente para reverter expectativa. O ano de 2017 também já está comprometido.

Em uma palestra em um think tank em Washington, logo na iminência do impeachment, com todos muito animados, eu disse: “vocês estão completamente equivocados em querer colher maracujá em pé de laranja. Dessa coalizão de corruptos, incompetentes e entreguistas, não sai nada senão corrupção, incompetência e entreguismo”.

IM – O ajuste fiscal não seria uma saída?

CG – A única forma de o Brasil sair da profunda crise fiscal em que se encontra é aumentar a receita. Nessas circunstâncias, há duas condições — o que não quer dizer que não se tenha que impor a eficiência da despesa. Uma delas é, de forma segregada, imediatamente aumentar alguns tributos, como Cide e CPMF. Mas estrategicamente só há um jeito de fazer a receita voltar a crescer: o país assumir a decisão de crescer.

Para isso, é preciso fazer grandes movimentos de conjuntura, como consolidar o passivo do setor privado, descendo a taxa de juros aceleradamente. Mas também proponho que se possibilite a consolidação de passivo com US$ 50 a 70 bilhões extraídos das reservas e alocados em um fundo soberano, que pode ser feito nos BRICS ou em um fundo soberano que o Brasil crie. Seria trocada dívida interna no juro brasileiro por uma dívida externa, com câmbio razoavelmente estabilizado, correndo a taxa de juros negativa no exterior. Você pagaria o hedge e ainda compensaria dramaticamente, também sendo um grande coadjuvante para a retomada do investimento privado e da queda da taxa de juros pela consolidação dos passivos de grandes empresas brasileiras, que tinham plano de investimento quando esses estúpidos começaram a destruir a economia.

IM – Nesse cenário de dificuldades na economia, o senhor vê Michel Temer encerrando o mandato em 2018?

CG – Não consigo ver. A elite brasileira sabe que não dá para esperar tanto tempo e vai cavar o buraco para ele também.

IM – Levando-se em consideração sua experiência parlamentar e como ministro e governador, qual é a avaliação que tem da atual situação de governabilidade de Temer? Um forte apoio congressual, mesmo em meio às fraturas na base, e a contradição com o elevado nível de reprovação popular.

CG – Ele não tem forte apoio no Congresso. A elite brasileira, a plutocracia, o baronato que manda no país e que baseou o impeachment é quem controla, de fora para dentro, esses congressistas. Eles deram a Michel Temer, que é uma pinguela ou um trambolho, tarefas para serem cumpridas. Para elas, há apoio no Congresso. Mas basta rivalizar com qualquer outro tipo de assunto [que se observa a fragilidade do governo]. Por exemplo: a reforma trabalhista não vai acontecer. Pergunte a opinião de Paulinho da Força (SD-SP), que estava junto com ele no impeachment, sobre esse assunto. Outro exemplo é a negociação dos governadores sobre a dívida. Pergunte ao filho do César Maia [Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados] a qual senhor ele serviu quando agiu lá. Então, vivemos de ilusões. Também é tarefa minha pedir ao jornalismo brasileiro que saia desse pacto de estupidez.

IM – O senhor compartilha do entendimento de que houve um golpe contra Dilma Rousseff e que ele não se restringe ao nível doméstico. Qual é o seu desenho da geopolítica do processo?

CG – Basicamente, o impeachment foi provocado ancestralmente pela descontinuação do governo Dilma, em função da distância entre a marketagem de campanha e a prática no início do segundo governo. Isso criou um ambiente que desconstruiu muito precocemente seu laço com o povo brasileiro. Ela fez uma opção de, ao não politizar os problemas estratégicos na campanha, enganar o povo e achar que teria tempo para corrigir. Essa é a causa remota.

A causa que se organizou – fissura, inclusive, pronta nessa contradição de Michel Temer — tem três interesses bastante práticos:

1) Gerar excedentes fiscais, em ambiente de agonia fiscal, a qualquer preço para proteger a inflexão da proporção dívida/PIB, para o rentismo. Essa é a primeira grande razão e a tarefa de Temer, que tem que cumpri-la e não o está fazendo. O déficit primário vai se aproximar de R$ 200 bilhões, enquanto o nominal, R$ 450 bilhões.

2) O alinhamento internacional do Brasil completamente desmontado. [Apesar de] Contraditória e despolitizada, a presença do país em uma ordem internacional difusamente multipolar teve aproximações sensíveis com Rússia em uma hora de Crimeia, com a China, em uma hora em que a estratégia americana era o Tratado do Transpacífico (que Trump prometeu revogar). Em um momento estratégico como esse, os primeiros centrais princípios da política do império são não permitir uma ordem multipolar que não se renda ao monopólio do poder que ganhou na bala, na Segunda Guerra Mundial, e se sustenta na base do termo de troca (dólar) e na sofisticação tecnológica.

3) A entrega do petróleo. Observe a pressa com que [José] Serra apresentou um projeto para eliminar as restrições de acesso da Petrobras a reservas [do pré-sal], de eliminar o conteúdo nacional e a pressa como estão vendendo subfaturados vários dos investimentos da companhia. Na cara da imprensa brasileira, venderam o campo de Carcará por US% 1,35 o barril de petróleo para uma estatal norueguesa e agora venderam, por US$ 2 bilhões coisa que custou recentemente US$ 9 bilhões, para a empresa francesa Total. Tudo com muita pressa.

As três grandes demandas Temer está tentando entregar. Não vai conseguir a mais grave, e, por isso, vai cair.

IM – Se o senhor se candidatar à Presidência em 2018, como pretende governar com um Congresso tão conservador, fragmentado e empoderado como o atual?

CG – Digo de novo: vou pensar mil vezes em me candidatar. Meu partido vai definir e cumprirei minha obrigação. Mas, se for, irei para fazer história.

O presidencialismo tem mil desvantagens e a mais grave delas é essa lógica de impasses, em que o presidente tem as responsabilidades pela saúde dos negócios de Estado e um Congresso, que não tem, no sentido jurídico do tema, responsabilidade nenhuma, pode diminuir ou aumentar despesas, sem pagar qualquer consequência, enquanto, no Parlamentarismo, isso não acontece.

Mas o presidencialismo também tem sua vantagem, que é a capacidade que o presidente da República tem tido, na tradição brasileira, de se escorar na opinião pública e fazer a construção de uma maioria de forma qualitativa. Fui ministro da Fazenda no governo Itamar Franco. Ele não tinha partido, não tinha maioria orgânica — o que não é meu caso, que tenho experiência política e tenho um partido, onde as alianças políticas são perfeitamente praticáveis –, mas, ainda assim, conseguiu governar com força política imensa e, cada vez que precisou, apostou no povo, na mobilização da opinião pública, para que os grupos de pressão clandestinos não o esmagassem.

IM – Um entendimento do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e uma lei recentemente aprovada pelo Congresso, à revelia do que determina a Constituição Federal, apontam para chances de eleições diretas em caso de queda do governo Michel Temer. O senhor se vê apto a se candidatar se o processo eleitoral se iniciasse amanhã?

CG – Meu partido que vai resolver isso e cumprirei minha responsabilidade. Mas, se for, farei o que deve ser feito pelo País, para voltar para casa com a consciência tranquila. Tenho muita esperança e confiança de que é possível resolver o problema do país, não que seja simples ou fácil, mas é perfeitamente praticável fazer o Brasil retomar seu destino, que não é essa mediocridade corrupta que tomou conta.

Mas estou muito incomodado com esse estado de anarquia que as coisas têm acontecido. A Constituição diz que, se o presidente da República for cassado, o vice assume. Se o vice, por alguma razão, sair antes de dois anos de mandato, há eleições diretas. E, se ele sair depois de dois anos, a eleição é feita indireta pelo Congresso. Eu tenho nojo e pavor da ideia de que isso vá acontecer. Mais nojo e pavor tenho da ideia de se ficar manipulando a Constituição, desses juízes que fazem discursos políticos, porque isso é um estado de baderna e é muito pior do que qualquer outra coisa.

IM – A Operação Lava Jato é um tabu para a esquerda. Enquanto parte apoia, outra foge do debate, e uma terceira parcela critica abusos cometidos e os efeitos gerados para a economia do país e as empresas. Como promover um combate à corrupção sem provocar grandes fissuras na economia? O que o senhor proporia de diferente?

CG: Temos que olhar as coisas complexas com olhares complexos. A Lava Jato é uma coisa essencialmente importante para o Brasil, porque parece dar fim ao histórico de impunidades do baronato da política e do mundo empresarial. Por isso, ela merece todo o apoio e estímulo.

Isto dito, temos também alguns problemas, como o excesso de aplausos e exibicionismos de juízes e procuradores. Isso não é bom, mesmo para a Lava Jato, porque à medida que você extrapola, o risco de suspeições está dado. Várias sentenças que alçaram a segunda instância da Justiça foram anuladas, é só se lembrar da Operação Satiagraha. É isso que está fadado a acontecer se não forçarmos a mão com essa garotada de Curitiba. Eles têm que se lembrar que Justiça é severidade, modéstia e não ficar se exibindo.

Outra coisa gravíssima é que quem comete crime é a pessoa física. No ordenamento jurídico brasileiro, pessoa jurídica não comete crime. Então, as punições têm que ser severas, mas destinadas exclusivamente à pessoa física, que praticou o ato ilícito. O mundo inteiro salva a cara das empresas. A Construção Civil é um dos raros setores em que temos algum protagonismo global, mas eles estão destruindo as empresas. Isso, no entanto, não é culpa dos juízes, mas dos políticos, que não têm coragem de fazer acordo de leniência e não deixam que os juízes cumpram suas tarefas de dar a pena que for necessária para as pessoas. Mas salvar as empresas para que elas atuem é um imperativo de ordem pública no Brasil.


por Celsão correto

figura retirada de outro post nosso (aqui). A entrevista também pode ser lida aqui e aqui.

previdencia-08_08_16Nos últimos dias, voltou à voga a discussão sobre a reforma na Previdência Social. Que significa diretamente a mudança no modus operandi dos benefícios de aposentadoria pagos pelo governo.

A mudança nesse ponto é constante e se deve ao fato irrefutável que o brasileiro vem aumentando sua longevidade. Isso, aliado à baixa natalidade, traz cada vez menos contribuintes [do INSS], ou simploriamente trabalhadores, para um número crescente de beneficiários, também chamados de aposentados.
Fiz uma conta “burra”, numa conversa informal: se tivermos 50% de aposentados e 50% de trabalhadores, cada trabalhador pagando 11% do seu salário ao INSS, cada beneficiário terá um salário de apenas 11% do salário dos contribuintes. Pouco, se pensarmos que a média de salários do país é de R$1987 (dado para 2014, homens – aqui). Se quiséssemos um sistema eficiente e auto-suficiente, essa seria a conta-base.

Isso posto, vamos aos pontos “piratas” que tenho a expor.

Não adianta mudar a regra, de 30-35 anos de contribuição ou de 60-65 anos de idade, aumentando ambos os números indefinidamente. A relação de quem paga versus quem usufrui está errada. E não é somente pelo número de pessoas, mas principalmente pela ausência de teto e uniformidade nos benefícios concedidos.
Enquanto o trabalhador da iniciativa privada tem teto de R$5.189, 82 (fonte aqui), funcionários do serviço público, concursados ou não, militares e ex-funcionários dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário não possuem limite.
E são exatamente essas aposentadorias de 20 ou 30 mil reais que oneram a Previdência na minha opinião.

Os políticos representam um caso a parte.
Aumentam o próprio salário, causando aumentos em cascata para cargos correlatos em outros poderes.
E possuíam uma previdência especial, chamada IPC (Instituto de Previdência dos Congressistas), hoje extinta, que previa aposentadoria a partir do segundo mandato, a partir dos 50 anos de idade.
Só as aposentadorias do IPC drenaram dos cofres públicos R$116 milhões em 2014 (fonte aqui).
Proponho não apenas o mesmo limite para cargos públicos , nos R$5.189,82, mas a adoção do salário do político baseado na média dos seus vencimentos dos últimos 24 meses. Afinal, é injusto “lucrar” com a política e com a posterior aposentadoria, se o cidadão era taxista e obtinha vencimentos médios de R$2.000,00.

Outro capítulo poderia ser erigido em relação aos militares; que passam (ou passavam sem custo extra até 2001) os seus benefícios para as viúvas ou filhas solteiras ao falecer.
O mínimo que poderia ser feito (e essa é a minha proposta pirata) é o recadastramento das beneficiárias, sobretudo as filhas, que propositalmente não se casam para seguir exaurindo montantes significativos dos cofres públicos, via pensão vitalícia.
É curioso, inclusive, o fato do presidente Michel Temer e seus ministros haverem decidido “poupar” os militares na atual agenda (aqui). Curioso inclusive pelo montante dos benefícios pagos a essa classe de “trabalhadores do Estado”. De acordo com o link anterior, o valor pago aos militares superou os R$32 bilhões em 2015 (sendo quase R$4 bilhões em pensões para as filhas solteiras – aqui)

E as mudanças que proponho não atingiriam somente esses, mas todos os “marajás”, emprestando um termo do ex-presidente Fernando Collor de Mello; proponho reduzir todo valor acima do teto num período de “carência” de doze meses, trazendo para um limite único. (como já proposto nas ideias piratas para o Brasil – aqui)
Um procurador da República ou professor universitário, com salário acima do teto da aposentadoria “privada”, aproveitou das benesses do salário e cargo durante a vida profissional. E, via de regra, conseguiu adquirir bens ou mesmo constituir fontes alternativas de renda nesse período, como previdências complementares.
(Se não o fez, terá de se adaptar à nova vida. Como outros cidadãos brasileiros. Simples assim!)

Proponho também acabar com aposentadorias acumulativas. Se os ex-presidentes Lula e FHC possuem mais de uma aposentadoria, quer seja por ter sido exilado, anistiado, professor aposentado… E se o atual presidente Michel Temer também usufrui de aposentadoria há mais de vinte anos, segundo ele próprio um mau exemplo (aqui), há erro e erro grave!
No caso de Temer, poderia ter renunciado a aposentadoria de Procurador do Estado de São Paulo ao ser eleito vice-presidente…
Minha regra seria: se o trabalhador ainda quer e pode trabalhar, ótimo! Mas ao se aposentar, não deve sobrecarregar um sistema deficitário, extraindo ainda mais do mesmo. Pode até escolher qual dos benefícios será usado para o cálculo da aposentadoria, mas deve escolher uma única.

previdencia-social-300x246E não é só no teto, no limite superior dos benefícios que há problema…
O maior problema pra mim está no trabalhador “normal” ou “não-intelectual”, muitas vezes do campo ou braçal. Ele não vive os mesmos sucessos de aumento da longevidade e de qualidade de vida das classes abastadas.
Parar de trabalhar por força maior (ou pela falta dela) será cada vez mais frequente, com o avanço da idade mínima de aposentadoria. E o aumento dessa idade, diminuirá diretamente a probabilidade deste trabalhador chegar a gozar do sonhado “salário fácil”.
E… Se este contribuinte não tiver saúde para exercer o seu trabalho, será demitido; e não conseguirá outro trabalho formal, que o permita contribuir. Sem contribuir não terá acesso.
O que faz do aumento da idade, um meio de segregar os que mais precisam, ou precisarão da aposentadoria para viver dignamente.

E solução para esse último ponto eu não tenho.
O ex-Ministro e ex-Governador Ciro Gomes propõe a mudança completa de um regime de repartição para um de capitalização (algumas ideias podem ser lidas aqui). O dinheiro da previdência complementar e obrigatória do funcionalismo público geraria um fundo e cada trabalhador da iniciativa privada seria responsável por seu próprio “bolo” a dividir e usufruir nos anos de aposentado.

É melhor do que temos hoje… Mexer nos “graúdos”, principalmente políticos, militares e funcionários públicos com múltiplos benefícios; e poupança própria para os novos ingressantes.

por Celsão correto

figuras retiradas daqui e daqui

P.S.: São muitos os pontos propostos na Reforma da Previdência que não agradam trabalhadores e sindicatos. Uma delas é a alteração da integralidade da aposentadoria por invalidez (aqui). Que pode ser vista também como uma segregação social, da própria Previdência Social

P.S.2: para quem quer saber o valor das aposentadorias pagas a senadores e deputados pelo IPC, o link está aqui. Ali estão José Sarney, Fábio Feldmann, Eduardo Suplicy e Delfim Neto. Pra citar alguns poucos exemplos…

7jul2016---o-presidente-interino-michel-temer-participou-de-uma-reuniao-com-o-ministro-da-fazenda-henrique-meirelles-para-definir-a-meta-fiscal-de-2017-no-palacio-do-planalto-1467930077352_615x3Nosso querido ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, queridinho da mídia que o nomeou “Solução da Nação”, apareceu novamente no noticiário nacional.
Ele e sua equipe admitiram um déficit (ou rombo) de R$139 bilhões nos cofres públicos para o ano de 2017, mesmo com aumento de arrecadação previsto de R$55 bilhões. (aqui a notícia que também fala de provável aumento de impostos)

E não é estranho pra mim aparecer um rombo muito maior que o previsto anteriormente pela presidente Dilma.
Primeiro pois, em meio a crise, a presidente afastada havia vetado um reajuste salarial ao Ministério Público e Poder Judiciário. Reajuste que foi (re-)aprovado em novas seções das casas do Legislativo, nesse mês de Junho, pauta tratada assim que o presidente Temer assumiu interinamente (notícias aqui e aqui, para as aprovações na Câmara e Senado respectivamente)
O impacto calculado desse reajuste do funcionalismo é de R$58 bilhões nos próximos três anos, ou seja, consumindo boa parte do aumento de tributos previsto.

O segundo ponto da minha crítica, que é ainda mais grave,  é a propaganda vazia de redução de custos, alardeada por Meirelles e pela “nova equipe econômica” ao assumir a pasta da Fazenda.
O que aconteceu com aquela redução prometida de Ministérios e gastos públicos?
Fizeram o oposto com reajustes salariais, que, todos sabemos, serão facilmente “cascateados” aos outros poderes, que apelam para uma tal de “isonomia”, criada por eles próprios

Aparentemente o que fez Meirelles e a equipe aclamada pelo empresariado, foi “raspar” onde havia algum dinheiro, como fizeram com o chamado Fundo Soberano (aqui). Mas, ao meu ver, e agora chegamos ao porquê do post, todas as medidas são meramente paliativas, de baixo impacto e sem efeito duradouro.

De que vale um fundo de R$2 bilhões, provenientes de um superávit do petróleo, que seria usado (até onde me lembro) para a educação no meio de um problema de R$140 bilhões?
É menos de 2%!
E perde-se a chance de criar um “pulmão” financeiro estatal que um de nossos vizinhos regionais mais proeminentes, o Chile, criou através de reservas da exploração do cobre.

Outra medida paliativa citada ontem: revisão dos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença.
É paliativo! É pequeno!
A equipe do Ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, declarou que espera economizar R$6,3 bilhões! Quase R$4 bilhões cortando 30% dos benefícios de auxílio doença e pouco mais de R$2 bilhões eliminando 5% dos beneficiários aposentados por invalidez.
Comparando-os uma vez mais ao rombo anunciado, são menos que 5%.
E esse valor só virá se os cálculos estiverem corretos. E muitos velhinhos e incapacitados estiverem “de má fé” em casa evitando trabalhar…

Outra colocação a ser considerada é a afirmação defendida pelo ex-Ministro Ciro Gomes. Ciro sempre diz que reduzir Ministérios não é reduzir custos. Ao menos não drasticamente, na escala almejada e proclamada pelo atual governo.

Mas minha proposição “pirata” é: por que não mudar de verdade? Colocar as mãos inteiras no vespeiro?
Falando de aposentadorias e INSS…
Por que não limitar as aposentadorias do funcionalismo público no mesmo teto existente para os empregados da iniciativa privada? Incluindo aí deputados, senadores e juízes.
Ou melhor, por que não estabelecer os mesmos critérios para aposentadoria em todas as profissões e classes? Não é injusto um Senador aposentar-se após um único mandato?
Ou ainda, que tal se não houvessem aposentadorias acumulativas? Lula perderia talvez a de anistiado. FHC perderia a de professor universitário estadual.
E até se poderia permitir que o benefício recebido fosse o maior dentre os concedidos…
Será que essas medidas não trariam uma maior redução de despesas?

Pra finalizar, uma última pergunta: não era o anúncio do aumento de impostos que condenou a equipe econômica anterior?
Não sou totalmente contra. Creio até que não tenhamos muita alternativa dada a estrutura “engessada” do Estado Brasileiro.
Mas o problema de se fazer isso agora é a cara-de-pau de nem ao menos cumprir um “mínimo” da redução prometida…

por Celsão irônico

P.S.: figura retirada daqui. Eles não ficam bem lado a lado?

P.S.2: sou a favor de se revisar periodicamente todo e qualquer benefício concedido. Só não acho que isso deva ser apresentado como medida; por ser pequena, como citei, e por fazer parte de uma rotina mínima esperada de órgãos governamentais.